sábado, 2 de março de 2013

Como Será o Futuro




O futuro - como ele será: petróleo


Um xeique sonhava com o seu Rolls-Royce puxado por dois camelos enquanto via a bomba de gasolina secar. Na melhor das hipóteses, segundo a SUPER de junho de 1993, as reservas mundiais de petróleo durariam 70 anos. E o argumento era sensato - o suprimento de petróleo se formou em milênios, eras, éons, mas era consumido em séculos, década, anos. A conta era a seguinte: até 1990, haviam sido consumidos 650 bilhões de barris; restavam outros 950 bilhões descobertos. A produção acabaria atingindo um pico. Depois disso, só haveria queda.

Mas a realidade se mostrou diferente. As reservas provadas subiram para 1 653 bilhões de barris, em 2011, segundo a British Petrol. Hoje também se consegue fazer mais com menos energia (é só comparar o consumo do seu carro com o do primeiro carro do seu pai). E, por fim, nunca se investiu tanto em fontes alternativas de energia. E por que o cenário melhorou? Exatamente porque o petróleo vai acabar.

As fontes tradicionais de petróleo como os gigantescos campos no Oriente Médio devem parar de crescer em 2030, segundo a Agência Internacional de Energia. Isso numa época em que o consumo de petróleo terá aumentado 50%. A consequência natural é que o preço do petróleo aumente. E isso é bom para a exploração em reservas antigamente consideradas inviáveis.

Em 1993, o barril custava o equivalente a 27 dólares de hoje. Passados 20 anos, seu valor é 4 vezes maior - próximo ao preço de 1980, em plena crise do petróleo. Com uma etiqueta desse valor, já passou a valer a pena investir em tecnologia e infraestrutura para explorar reservas difíceis de alcançar, como os 70 bilhões a 100 bilhões de barris do pré-sal brasileiro, os mais de 100 bilhões de barris de petróleo extrapesado venezuelano, os 175 bilhões de barris nas areias de alcatrão canadense e os 90 bilhões de barris do Ártico. O resultado é que, em vez de um pico seguido por queda, deverá haver um teto ondulante, mantido pela exploração de reservas cada vez mais difíceis, mas viáveis por conta dos altos preços do petróleo.

E mais. Nas duas últimas décadas a matriz energética do mundo ganhou um gás. Literalmente. A oferta de gás natural aumentou tremendamente nos EUA, China, Austrália, Moçambique, Qatar e Tanzânia - 45% dela em reservas não convencionais, como o gás de xisto, que nos EUA subiram de 2% na década passada para 37% do total produzido. Lá, as reservas são suficientes para dois séculos.

O problema mais sério é que as fontes não convencionais de hidrocarbonetos são ainda mais poluentes. Para cada parte de petróleo tirado da areia de alcatrão canadense, por exemplo, são usadas outras 4 partes de água doce. Além de energia para derreter a coisa. E o fato de continuarmos a depender de hidrocarbonetos (e conseguir extraí-los) agrava o verdadeiro problema que encontraremos no futuro: a mudança climática.
Reservas existentes
Como seria - Pela metade do século 21, acabariam as reservas mundiais de petróleo: 950 bilhões de barris.

Como é - As reservas aumentaram para 1 653 bilhões de barris, com as reservas não convencionais.

Como será - O gás será o novo petróleo. É usado como combustível, matéria-prima de plástico. E não vai acabar cedo.


O futuro - como ele será: ambiente



Até 1987, ambiente era uma questão local. Era a despoluição do rio Tâmisa. Era a atmosfera de Los Angeles e de São Paulo. Até que satélites identificaram que 50% do ozônio sobre a Antártida havia desaparecido. "A alteração era tamanha que pesquisadores acharam que fosse um problema dos satélites", diz José Marengo, professor do Inpe e membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC). Mas o buraco sobre 15% da superfície terrestre era real, e sua causa tinha um nome: CFC, um gás usado em isopores, refrigeradores e em qualquer tipo de spray. Esse rombo aumentaria a incidência de raios ultravioleta e poderia engatilhar mudanças imprevisíveis no clima.

O medo foi tamanho que, pela primeira vez, líderes de países do mundo inteiro se reuniram em torno de uma questão ambiental. Em Montreal, Canadá, 24 países industrializados se reuniram para assinar um protocolo que regulou o uso do CFC - depois ratificado por todos os membros da ONU. Ambiente virou questão global. Passados 5 anos, acontecia a Rio 92, então a maior reunião de chefes de Estado. Mais 5 anos, era a vez do Protocolo de Kyoto (e em 2012, o Rio+20).

O buraco na camada de ozônio se estabilizou, e a opinião pública se voltou a outro problema já conhecido por cientistas: o aquecimento global. Segundo o último relatório do IPCC, a emissão de gases de efeito estufa deve aumentar entre 25% e 90% de 2000 a 2030. Do fim do século 20 ao fim do 21, a temperatura do planeta deve aumentar entre 1,1 °C e 2,9 °C se forem tomadas políticas pró-ambiente - ou de 2,4 °C a 6,4 °C, se nada for feito. Isso significa aumento do nível do mar entre 18 e 59 centímetros, mais ondas de calor, mais chuvas torrenciais em altitudes grandes, e mais secas em regiões tropicais e subtropicais - o que inclui o Nordeste brasileiro e a savana africana. O oceano ficará mais ácido, o maior aquecimento acontecerá no Ártico, e povoadíssimos deltas de rios como o Ganges sofrerão inundações e aumento de doenças.

Se esse cenário é mais desolador, por que o sucesso de Montreal não se repetiu em Kyoto e no Rio? A grande diferença é que o buraco no ozônio foi observado. Já o aquecimento global é calculado por modelos matemáticos (até por isso os aumentos previstos na temperatura vêm com precisão em casas decimais, apesar das enormes margens de erro). "E é mais fácil observar o passado do que projetar o futuro com um modelo", diz Marengo.

Mas o cenário não é tão desolador. Nunca se investiu tanto em energia limpa. Em 4 anos, o custo da energia solar caiu 75%. Segundo o Ministério de Minas e Energia, a produção residencial de energia solar já é economicamente viável para 15% dos lares brasileiros. E na década de 2030, o investimento em projetos de energia renovável deve atingir US$ 7 trilhões no mundo. E é bom mesmo que isso aconteça. Afinal, como nos lembra João Steiner, o passado não nos garante muita coisa. "De sociedades que se autodestruíram a história está rica."
Mudanças climáticas
Como seria - O clima na Terra seria desequilibrado pelo enorme buraco na camada de ozônio causado pelo gás CFC.

Como é - A maior ameaça é o aquecimento global. Mas diminuir a emissão de CO2 é mais difícil do que a de CFC.

Como será - Mesmo que o mundo adote políticas ambientais, a Terra esquentará entre 1,1ºC e 2,9ºC no fim do século.



O futuro - como ele será: população


Cidades se agigantam em países pobres, com populações famélicas tomadas por epidemias velhas e novas. Democracias são ameaçadas de extinção. Governos nacionais se enfraquecem - e em alguns casos são substituídos por uma combinação de feudalismo e tribalismo. E por fim a humanidade volta à Idade Média. Era o que previa o biólogo americano Paul Ehrlich, na SUPER de maio de 1993. A expectativa era de que a população mundial, então de 5,5 bilhões, aumentaria em 1 bilhão em 11 anos. A aids era só um sinal do fim dos tempos.

Em 2011, chegamos a 7 bilhões de habitantes. Mas, apesar de sermos tantos, nosso cenário é bastante diferente do previsto por Ehrlich. Desde 1950, a taxa mundial de fertilidade só cai - 5 crianças por mulher para 2,5 -, o que deve estabilizar a população mundial em 9 bilhões em 2050, 70% dela em cidades. Para garantir que não passemos fome, será necessário aumentar em 70% a produção de alimentos, segundo a FAO, agência da ONU para agricultura e alimentação. E recursos naturais para isso não faltarão, desde que 3 problemas sejam resolvidos: a mudança climática, a degradação ambiental das áreas cultivadas e a expansão do cultivo de biocombustíveis no lugar de alimentos.

Isso não significa que o mundo estará numa boa. O problema por vir é exatamente a baixa taxa de fertilidade. Já temos 80 países abaixo da taxa de reposição demográfica, de 2,1 bebês por mulher. Isso significa que essas nações estão envelhecendo e terão dificuldade para arranjar mão de obra ativa para sustentar seus aposentados. E o problema não será apenas na Europa, cuja população cairá de 730 milhões para 664 milhões na metade do século. Faltará gente na China. Ou, pelo menos, gente jovem. Lá, mulheres têm em média 1,4 filho, segundo o censo de 2010. Somando a isso o aumento de expectativa de vida, em 2050 o país terá 30% de seu 1,3 bilhão de habitantes acima de 65 anos. O risco é de que o país fique velho antes de ficar rico (o que também vale para o Brasil, que tem 1,9 filhos por mulher, segundo o censo de 2010). Quer mais? Com a política de filho único, o país estimulou o infanticídio e o aborto de meninas. Hoje já há 118 meninos para cada 100 meninas. Quando virarem adultos, haverá um batalhão de homens solteiros, o que não é uma receita para estabilidade social.

A solução pode vir do continente mais pobre do mundo. Na virada do século, a população africana deve subir de 1 bilhão para 3,6 bilhões. Será o continente mais jovem num mundo envelhecido. Com isso, países populosos como Nigéria, Etiópia, Tanzânia e Quênia podem seguir um caminho semelhante ao de China, Vietnã, Indonésia e de outros países asiáticos: sua população urbana jovem servir de combustível para a industrialização e o enriquecimento. Só que a história não é movida apenas pela demografia. O futuro do mundo vai depender de como os países africanos serão governados.
Demografia
Como seria - O mundo não daria conta do aumento populacional. O resultado seria fome, epidemia e caos político.

Como é - O crescimento da população freiou, a produção de alimentos cresceu e nunca se viveu num mundo tão rico.

Como será - A nova bomba será o envelhecimento da população mundial. E o futuro estará nas mãos de uma África jovem.


O futuro - como ele será: espaço



Viver orbitando sobre a Terra não bastava para a recém-lançada SUPER. Ela queria saber como seriam viagens que levariam o homem além da Via Láctea a velocidades muito próximas à da luz. O que veríamos? A 10% da velocidade da luz, nossa massa começaria a aumentar. A partir de 23%, as estrelas mudariam de cor. A 80%, as linhas se deformariam. Só não poderíamos chegar aos 300 mil km/s porque, na velocidade da luz, o foguete teria uma massa infinita e se tornaria um buraco negro.

Para isso, só precisávamos de supercombustíveis. Raios solares refletidos por canhões. Hidrogênio captado do Universo e fundido em hélio, como no núcleo do Sol. Ou a fusão de matéria e antimatéria - capaz de gerar uma energia tão potente que "um foguete de 100 mil toneladas alcançaria a velocidade de 1 100 km/s em menos de 10,5 dias".

Corta. A cena agora é julho de 2011. Atlantis, o último ônibus espacial em operação, retorna à Terra pela última vez. "A Guerra Fria foi vencida pelo capitalismo, mas quem consegue pôr hoje uma pessoa no espaço é a Russia. E a China. Quem diria", diz o astrofísico João Steiner, que já ajudou a consertar a miopia do telescópio Hubble, a construir um dos mais importantes observatórios do planeta no Chile - e que escrevia uma coluna para a SUPER nos anos 90. Com a queda da URSS, os EUA e aliados abandonaram o projeto da Estação Espacial Freedom - projetada para rivalizar com a Mir -, uniram-se aos russos e, juntos, gastaram US$ 100 bilhões com a Estação Espacial Internacional (basicamente para que cientistas soviéticos não fossem parar em nações párias como a Coreia do Norte). Hoje, goste-se ou não dela, a estação é um elefante branco orbitando a 400 km de distância. Nas palavras da revista britânica The Economist: "uma ridícula mansão nos céus" que "produziu pouco ou nada de ciência útil".

"O fato é que a opinião pública americana sempre apoiou muito as missões tripuladas. Era uma aventura", diz Steiner. Isso aconteceu porque a corrida espacial pegou carona na competição entre os dois blocos geopolíticos da Guerra Fria. O resultado foi o financiamento relativamente fácil de projetos bilionários. O programa Apollo, que levou o homem à Lua, custou o equivalente a atuais US$ 175 bilhões de 1961 a 1972. Com o fim da Guerra Fria, a aventura deixou de ter um vilão, e o herói perdeu o sentido de existir. Tchau, financiamento. Com exceção da China, que declarou oficialmente em dezembro de 2011 a intenção de levar novamente o homem à Lua, a era da viagem espacial acabou.

O que dizer do nascimento dos primeiros humanos em Marte em 2050, conforme a SUPER em 1988? "A cada 12 meses, previsões desse tipo são atrasadas em um ano", diz Steiner, rindo. E empresas como a Virgin Galactic, que oferece viagens espaciais suborbitais a 100 quilômetros de altitude? O bilhete da Virgin custa a partir de US$ 200 mil. Segundo a empresa, mais de 500 reservas já foram feitas.

O espaço então já era? Não. Na verdade, o estudo dos astros tem produzido descobertas em ritmo crescente. O fato é que existem duas coisas diferentes: o homem no espaço e a ciência. Tirar uma pessoa da Terra e trazê-la de volta sã tem um custo extraordinário relacionado não à pesquisa científica, mas à manutenção de condições de sobrevivência. Não é necessário o homem no espaço para produzir conhecimento sobre os astros.

"Está vendo essas duas imagens?", aponta Steiner para a tese de um orientando seu. Uma tem manchas embaçadas em preto e branco. Outra, manchas mais nítidas e coloridas. "A de cima foi feita pelo telescópio Hubble. A colorida, por um telescópio preso ao chão. Essas cores indicam movimento - o que o Hubble não informa." O Soar, telescópio ao qual Steiner se referia, está plantado no deserto do Atacama e tem um par no Havaí, com o qual forma o Observatório Gemini. Usando uma série de lentes, espelhos e sensores, ele consegue corrigir as interferências da atmosfera terrestre sobre as imagens do espaço. E, assim, produz informação tão boa - ou melhor - que o Hubble, sem precisar orbitar a 570 quilômetros do chão.

O sucessor do Hubble
Enquanto isso, a Nasa entra em eventuais quedas de braço financeiras com o Congresso americano para conseguir construir e lançar o Telescópio Espacial James Webb, construído em colaboração com as agências espaciais da Europa e do Canadá com um custo previsto de US$ 8,8 bilhões.

Em comparação ao Hubble, o Webb é um salto incrível. Não apenas por ser maior (22 metros de comprimento por 12 metros de largura, contra 13,2 m por 4,2 m do Hubble) e mais distante (a 1,5 milhão de quilômetros da Terra, o que significa que não receberá visita de missões tripuladas). Seu mérito está na capacidade de observar frequências infravermelhas, enquanto o Hubble se limita basicamente a ondas visíveis e às ultravioleta. Isso permitirá que ele veja galáxias em suas fases iniciais. Como? É quase simples. Da mesma forma que a música de um trio elétrico parece mais grave conforme ele se distancia, quanto mais longe um astro for, mais baixa será a frequência de luz que um telescópio observará - logo, mais em direção às ondas infravermelhas. E a imagem de um astro muito distante significa uma imagem de um passado também distante - afinal, a luz demora para viajar.

De acordo com a Nasa, a capacidade de observar ondas infravermelhas permitirá ao Webb ver algumas das primeiras galáxias ou objetos luminosos que se formaram depois do Big Bang. Ao serem comparados com galáxias mais recentes, será possível entender mais sobre seu crescimento e evolução. Poderemos observar a formação de estrelas desde os primeiros estágios até a formação de sistemas planetários. E medir as propriedades físicas e químicas de sistemas planetares - o que permitirá investigar o potencial de vida neles.
Homem no espaço
Como seria - Os EUA e aliados colocariam em órbita em 1995 a estação espacial Freedom para pôr a Mir no chinelo.

Como é - A Rússia se aliou aos EUA para desenvolver a Estação Espacial Internacional no lugar da Freedom.

Como será - Há pouco interesse em colonizar o espaço - exceto na China, que quer ser o segundo país a pisar na Lua.

Transporte no espaço
Como seria - Naves espaciais ganhariam novos combustíveis para atingir velocidades cada vez mais próximas à da luz.

Como é - Os EUA aposentaram seus ônibus espaciais, e hoje só Rússia e China conseguem de enviar pessoas ao espaço.

Como será - Empresas privadas abrem o mercado de turismo suborbital e de carga para a Estação Espacial Internacional.

Estudo do espaço
Como seria - O telescópio Hubble seria lançado e veria astros 350 vezes mais escuros do que os então conhecidos.

Como é - Telescópios no chão já produzem imagens tão boas quanto as do Hubble por um custo bem menor.

Como será - O Telescópio Espacial James Webb sucederá o Hubble e permitirá ver galáxias em seus estágios iniciais.

O futuro - como ele será: tecnologia


"Se tudo der certo, antes ainda do final do século, estarão prontos os frutos da revolução dos supercondutores", anunciava a reportagem de capa da primeira SUPER, em outubro de 1987. Desde então, previu-se que humanos colonizariam o espaço, que a comunicação quebraria fronteiras nacionais via antena parabólica e que a civilização sucumbiria diante da superpopulação. Mas o mundo mudou. Programas espaciais entraram em declínio, a internet surgiu e o crescimento populacional se estabilizou. O futuro não é mais o mesmo. Veja como ele será.
O futuro como ele será: robôs
O futuro como ele será: espaço
O futuro como ele será: saúde
O futuro como ele será: população
O futuro como ele será: petróleo
O futuro como ele será: ambiente

TECNOLOGIA - 1987/outubro/ed. 1

Um elefante branco transcorre os 30 quilômetros do aeroporto de Pudong até Xangai em 7 minutos e 20 segundos levitando sobre um campo eletromagnético, com uma lotação que mal passa de 20%. Isso é o mais próximo que o futuro chegou da reportagem de capa da SUPER número um - "O Fio Maravilha". Nela, trens supervelozes voariam a 10 centímetros do solo, linhas de transmissão teriam perda zero de energia e bobinas armazenadoras tornariam realidade o carro elétrico, com baterias caras e pesadas demais. Tudo por causa dos supercondutores.

Em 1987 cientistas colocavam suas maiores apostas nesse material. Fazia apenas um ano que dois químicos franceses tiraram do forno por acaso uma cerâmica que conduzia eletricidade sem perda alguma. Isso jamais fora visto em outro material e abria uma série de possibilidades. Como uma corrente elétrica iniciada num fio de supercondutor jamais é interrompida, uma bobina feita com ele obteria poderes magnéticos incríveis. Por exemplo, o trem que voaria sobre milhões de bobinas enfileiradas no leito da ferrovia. Ou sapatos que nos fariam deslizar sobre um piso magnético. "Mesmo os mais céticos acreditam que essas novidades começarão a invadir a vida cotidiana num prazo não superior a 5 anos", publicou a SUPER.

Só que supercondutores têm um problema - eles só funcionam sob temperaturas extremamente baixas. E 25 anos não bastaram para superar esse obstáculo. Nas palavras do especialista americano Paul Grant, os supercondutores eram "uma mina intocada de sonhos". E assim eles permanecem.

Decepcionante? Não. Nos primeiros anos da revista, Japão e França tinham juntos apenas 2 530 quilômetros de linhas de trem-bala com as convencionais rodas de aço. Hoje, a Europa e o Leste Asiático somam 17 mil quilômetros a velocidades comerciais que ultrapassam 300 km/h. E essa rede deve quase triplicar até 2025, segundo a União Internacional de Ferrovias. E o maglev, o trem de levitação magnética? A China planejava fazer mais uma linha, desta vez com 100 quilômetros, ligando Xangai à cidade de Hangzhou. Mas o projeto foi substituído pelo trem-bala convencional. O mesmo mundo que aposentou em 2003 o Concorde - o único avião supersônico comercial da história - optou por trens um pouco mais lentos, porém muito mais baratos. O pragmatismo ficou acima dos sonhos.

A segunda promessa dos supercondutores era deixar supercomputadores do tamanho de um PC - como essas cerâmicas não perdem energia, elas permitiriam que transistores diminuíssem de tamanho sem que derretessem de calor. Só que os chips de silício deram conta da miniaturização, e de 1 500 nanômetros em 1987 seus menores componentes chegaram hoje a 22 nanômetros. Com isso, de 275 mil transistores instalados num Intel 386 temos agora 1,4 bilhão no Core i7 de 3ª geração. "Com os processadores de silício dobrando seu número de transistores a cada dois anos, não houve janela de mercado para outros materiais, como o gálio - e os supercondutores", diz João Zuffo, o professor da Poli-USP que há 4 décadas construiu o primeiro circuito integrado da América Latina.

O problema é que finalmente a corrida da miniaturização dos transistores de silício parece chegar ao fim - o que deve acontecer em 2020, segundo o físico e futurologista Michio Kaku. Quando a corrente elétrica tiver de passar por "cabos" de 5 átomos de espessura, cairemos no princípio da incerteza de Heisenberg: não será possível saber onde está um elétron. E eles perderiam a capacidade de transmitir informação em chips, como fazem hoje. Ou seja, o futuro da indústria da informática depende do que substituirá o processador de silício. Há várias possibilidades: computadores celulares, moleculares e, a longuíssimo prazo, quânticos - que usam partículas subatômicas no lugar de transistores.

Já existem moléculas capazes de liberar a corrente elétrica numa posição e barrá-la numa outra posição. Ou seja, permitem o sistema binário, baseado em sinais "1" (corrente passa) e "0" (corrente não passa). Mas como produzi-las em massa e conectá-las na forma de um processador? Outra molécula pode ser o grafeno (leia na página 65), que formaria o menor transistor molecular possível. Mas ele tem um problema: não interrompe a corrente elétrica. Aí não tem sistema binário. Ploft.

Enquanto isso, o limite de tamanho de componentes dos processadores não impede outra evolução: a quantidade de seus núcleos. "Temos processadores dual core, quad core... Isso crescerá para 8 núcleos, 16 núcleos. Em 2020 talvez tenhamos processadores com 2 048 núcleos. O problema aí é como distribuir a tarefa", diz Zuffo.

Rede maravilha
Em maio de 1988, a SUPER previu que a humanidade se aproximaria via informação, "independentemente de fronteiras, nacionalidades ou correntes políticas". Nada mais óbvio que o meio fosse a... antena parabólica. O Brasil já tinha mais de 20 mil equipamentos, que captavam programas de 8 países. E a internet? Nos primeiros anos da revista, não passava de uma obscura rede universitária. Já em 1994 passou a ligar 20 milhões de pessoas, concentradas em países ricos.

Para ter uma ideia de como o Brasil ainda engatinhava, a SUPER precisou ir até a USP para fazer sua primeira entrevista ao vivo on-line, em 1994. Lá, conversou com um estudante do MIT de 22 anos sobre "suas aventuras pelo universo eletrônico" - visitar museus e acompanhar imagens da Nasa. Hoje, um terço do mundo está conectado.

E o que teremos nas próximas décadas? Uma soma da miniaturização dos chips com a conectividade da internet em todo tipo de objeto cotidiano, diz o professor Zuffo. Hoje, o processador de smartphone tem capacidade de processamento maior do que a de toda a Nasa em 1969, quando ela enviou o homem à Lua. Se o barateamento continuar, chips invadirão da roupa à mesa do restaurante, todos se comunicando na hoje famosa nuvem.
Transporte
Como seria - Um trem que levita sobre supercondutores bateria o dobro da velocidade de trens-bala convencionais.

Como é - Há no mundo 17 mil km ferrovias de alta velocidade, mas só 30 km de maglev, ou seja, de trens que levitam.

Como será - Em 2025 haverá 42 mil km de ferrovias de alta velocidade, incluindo no Brasil, Rússia, Índia e Irã.

Informática
Como seria - Supercondutores deixariam supercomputadores com o tamanho de um PC, sem superaquecê-los.

Como é - O número de transistores num chip de silício aumentou 5 mil vezes, por conta de sua miniaturização.

Como será - O silício deve ser trocado por moléculas-transistores para que processadores fiquem mais possantes.

Comunicação
Como seria - O mundo entraria na era da informação sem barreiras nacionais - via televisão, com antenas parabólicas.

Como é - Um em cada 3 humanos se conecta via internet, e cada vez mais fazem isso com dispositivos móveis.

Como será - Microchips ficarão tão baratos que serão instalados nos objetos mais ordinários, que se comunicarão entre si.

O futuro - como ele será: robôs


Asimo tem 12 anos, 1,30 metro de altura, 48 quilos, é japonês e se veste como um pequeno astronauta. Reconhece vozes. Verte o suco de uma garrafa num copo e o serve a um humano. É um robô formidável. Mas, quando o seu país encarou o desastre de Fukushima, quem entrou em cena para avaliar os estragos do maior acidente nuclear desde Chernobyl não foi Asimo. Foi um time de robôs militares americanos muito menos simpáticos.

Por terra vieram as miniaturas de tanques desenvolvidos pela iRobot para o uso em combate no Afeganistão. Um deles - o PackBot, com o tamanho de um laptop, esteiras para terrenos acidentados e um braço mecânico com câmera - filmou o interior da usina e mapeou pontos radioativos. Um modelo maior removeu escombros de até 70 quilos. Já o RQ 16a T-Hawk - um mini-helicóptero não tripulado - coletou imagens aéreas da usina.

A moral da história é que, enquanto a indústria japonesa gastou décadas para criar robôs humanoides capazes de fazer o que nós fazemos, a máquina de guerra do Pentágono investiu em máquinas que fazem o que não podemos. O coração desse novo capítulo da robótica é a Agência de Pesquisa em Projetos Avançados de Defesa, do Pentágono. Em 1968, ela tinha criado o embrião da internet. Nos anos 80, inventou os caças invisíveis. E com a eclosão da guerra ao terrorismo, em 2001, passou a investir em robôs. E por que robôs?

A razão chama-se guerra assimétrica. Na guerra ao terrorismo, o combate não acontece entre Forças Armadas de países rivais, mas entre um Exército nacional e inimigos inflitrados entre civis. Aí, caças supersônicos e bombas atômicas desenvolvidos na Guerra Fria deixam de ser importantes. Muito mais útil é um discreto robô bisbilhoteiro que reúna informações sobre o próximo lugar de ataque.

Os primeiros robôs da guerra assimétrica foram os "drones" - veículos aéreos não tripulados, filhos dos aeromodelos. A maioria deles serve para reconhecimento de campo, vigilância e coleta de informações. Mas há também os drones para ataques aéreos, como o Avenger, invisível para radares e capaz de carregar 2,7 toneladas de bombas. Em 8 anos, drones foram usados em 302 ataques, deixando entre 1 845 e 2 836 mortos - 17% deles civis, segundo a ONG New America Foundation.

E as pesquisas continuam. Para conseguir mentes brilhantes que projetem máquinas de guerra, a Darpa lança concursos à comunidade científica. Em 2005, ofereceu US$ 2 milhões para quem construísse um carro que andasse sozinho por 200 km na montanha - 5 completaram o percurso. Em 2007, o desafio foi que esses veículos também seguissem a sinalização de trânsito. E em outubro será a vez do concurso para robôs com braços, pernas, torso e cabeça, capazes de, sem controle humano, manusear de ferramentas comuns até carros. Isso para substituir pessoas em ambientes perigosos e degradados.

O que isso tem a ver com nossa pacata vida civil? Fukushima é só o primeiro exemplo. Com um custo muito menor do que o de um helicóptero, pequenos drones poderão monitorar o trânsito, perseguir carros fugitivos, vasculhar florestas e montanhas em operações de busca e resgate e controlar fronteiras. Nos EUA, uma pesquisa com 1 708 pessoas concluiu que 4 em cada 5 pessoas apoiam esse tipo de ação. E ela virá em breve. O Congresso dos EUA ordenou a Administração Federal de Aviação a criar um plano para que drones circulem pelo espaço aéreo civil em 2015.

E a inteligência?
Por maiores que sejam suas capacidades, esses robôs são mais burros do que uma formiga. O drone precisa de piloto - ainda que ele esteja no solo. Carros sem motoristas seguem instruções predefinidas e se orientam pelo GPS, nunca por conta própria. E robôs fofos como o Asimo se limitam a seguir um roteiro. Já uma formiga procura comida sozinha e volta à casa em linha reta.

E o Deep Blue, da IBM, que em 1997 derrotou o maior enxadrista do mundo? Esqueça. "Quem deu entrevistas à imprensa foi o derrotado, uma vez que o computador não sabia falar", lembra Michio Kaku. Já Watson sabe. Esse robô, também da IBM, venceu em 2011 os melhores competidores humanos do jogo de dicas e respostas "Jeopardy!". Ele ouve as dicas em linguagem oral, faz associações a partir de milhões de textos sua memória de 15 mil gigabytes e responde em linguagem oral. Mas não consegue realizar a tarefa mais básica para um humano: aprender a interagir com o mundo sem roteiro.

Isso é tão difícil porque computadores processam informações de forma completamente diferente de humanos. Num computador, você fornece um dado, o processador o transforma de acordo com uma regra preestabelecida e o resultado é um novo dado. A regra é dada de cima para baixo, em série. Já na mente acontece o contrário. Ela é formada por redes neurais, que funcionam não em série, mas paralelamente. Difícil de entender? Pense então num bebê. Para ele responder a uma situação, várias vias neurais são ativadas ao mesmo tempo. Conforme a prática, a via neural que levar a um resultado melhor se tornará mais e mais forte, e as outras se desativarão. É assim que se constitui o aprendizado - uma regra construída de baixo para cima, a partir dos sentidos, da experiência e dos erros.

Teoricamente seria possível um supercomputador simular o cérebro humano, imitando 100 bilhões de neurônios conectados cada um a milhares de outros neurônios realizando sinapses numa velocidade inferior a um milissegundo. Para isso, seria primeiro necessário um computador de 36,8 quatrilhões de cálculos por segundo (petaflops). Disso não estamos longe - o supercomputador mais potente do mundo, o IBM Sequoia, chega a 16,32 petaflops. Depois, seria necessário fazer a engenharia reversa do cérebro. Bom, segundo o futurologista Ray Kurzweil, isso deve acontecer em 20 anos. Quem viver verá. Ou não.
Aplicação
Como seria - Até 2014 robôs domésticos fariam parte do dia a dia tal como computadores e telefones celulares.

Como é - Em guerras, robôs já coletam informações e atacam pelo ar - e lentamente ganham aplicação civil.

Como será - Robôs substituirão o homem em situações de risco, como resgate em catástrofes, e auxiliarão a polícia.

Autonomia
Como seria - Robôs seriam capazes de aprender a partir da experiência da mesma forma que os humanos.

Como é - Robôs ainda são controlados remotamente por humanos ou por programação feita por humanos.

Como será - A indústria bélica produzirá robôs humanoides que agem sem comando, mas sob a supervisão humana.

Inteligência
Como seria - Computadores não só conseguiriam raciocinar como também adquiririam consciência.

Como é - Máquinas já recebem comandos de voz, reconhecem faces e linguagem verbal e traduzem textos.

Como será - Computadores terão a capacidade de processamento do cérebro, que poderá um dia ser simulado.


O futuro - como ele será: saúde



"Quase todo dia algum colega me liga achando que pegou aids", dizia à SUPER em 1988 a médica Lair Guerra de Macedo, idealizadora do Programa Nacional de DST e Aids. Naquele ano, a síndrome havia matado 40 mil pessoas. Índia e URSS exigiam o exame de HIV para entrar em seu território. Bélgica e a Inglaterra também fizeram isso com todos os estudantes vindos de suas ex-colônias africanas. E o único antirretroviral era o AZT - que custava custava US$ 20 mil por ano.

No Brasil, a fiscalização mal chegava a 50% das coletas de sangue. E a falta de estrutura não ajudava. O consultório que atendia soropositivos no Instituto de Infectologia Emílio Ribas funcionava num banheiro, e as coletas de sangue eram feitas no corredor, embaixo da escada. Para complicar, havia até cientistas defendendo a inocência do HIV - como o biólogo alemão Peter Duesberg, para quem a aids era causada pelo consumo de drogas no Ocidente e desnutrição ou falta de higiene na África.

Essa história teve um ponto de virada: 1996. Nesse ano, foram concluídos os primeiros testes de uma nova família de drogas: o inibidor da protease. Um exemplo de como a expectativa de vida aumentou é o ex-jogador de basquete Magic Johnson, que anunciou em 1991 ser soropositivo. Desde então abraçou o ativismo no combate ao vírus e se tornou um megaempresário. Com a combinação de diferentes antirretrovirais, a medicina transformou o HIV de sentença de morte em liberdade condicional.

O impacto do tratamento não teria sido tão grande se não fosse uma luta de países em desenvolvimento encabeçada pelo Brasil pela quebra de patentes. De US$ 10 mil em 2000, o coquetel caiu para a partir de US$ 130 por ano em países pobres, onde a maioria das drogas anti-HIV pode ser vendida em versões genéricas. E no Brasil o tratamento é coberto integralmente pelo SUS.

Campanhas de prevenção também diminuíram o número de novas infecções - hoje 21% menor do que no pico da epidemia em 1997, segundo o programa da ONU para a aids. E vacinas? As testadas até agora ou não funcionam ou protegem muito pouco. Mas o uso de antirretrovirais já foi aprovado nos EUA como método preventivo em casos excepcionais - como o de pessoas em relacionamento estável com um soropositiva. Isso diminui em 70% o risco de infecção.

E o câncer? Em 1989, Ricardo Brentani, diretor do Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer, disse à SUPER que "o freio da doença" fora descoberto. Uma solução seria injetar no paciente genes supressores do crescimento alojados em vírus modificados geneticamente. Em 2003, o Instituto Nacional do Câncer dos EUA deu 2015 como data-limite para domá-lo ou abatê-lo de vez. Afinal, nunca houve tanto conhecimento, tecnologia e recursos para seu combate. Mas a previsão hoje parece otimista demais.

Ainda assim o futuro é promissor para a saúde. E a razão está longe do hospital. Com equipamentos pessoais para diagnóstico e aplicativos de celular, diagnósticos serão mais precoces, e o acompanhamento de doenças crônicas, mais constante. Não estamos longe disso. Um estudo britânico de 2011 avaliou o impacto de tecnologias de saúde à distância em 6 mil portadores de doenças crônicas. Resultado: as idas ao hospital caíram em 20%, e as mortes, em 45%. Não é que o médico será substituído. Mas ele terá dados de melhor qualidade e entrará em cena quando sua presença for necessária - uma grande vantagem para países como a Índia e o Brasil, que têm respectivamente 6 e 17 médicos para cada 10 mil pessoas, contra 40 na Noruega.
Aids
Como seria - Chegaríamos a drogas que matam 98,9% dos vírus. Só faltava saber o que fazer com o 1,1% restante.

Como é - Antirretrovirais se popularizaram. E seu uso preventivo em casos excepcionais já foi aprovado nos EUA.

Como será - Mesmo sem cura nem vacina, a aids como causa de morte cairá do 6º para o 10º lugar em 2030.

Nenhum comentário:

Postar um comentário